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quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O mal que ainda me faz, sem perceber


E o coração ainda salta. Talvez de burro que seja. Ou de ingênuo, atrasado, infantil. Eu cheguei a me sentir segura e auto-suficiente. Bem resolvida. A princípio, me vangloriei, achando que você poderia entrar e sair do meu campo de visão milhões de vezes, que nada aconteceria. Nada dentro de mim aconteceria. "Recebam minha passividade". Disse isso a todos os "para sempres" que nasceram na minha própria boca nos últimos anos. Fiquei exultante de perceber que eu tinha errado ao colocar todas aquelas promessas de eternidade no mundo. Finalmente, acabou.
Acabou até o segundo do olho no olho, onde toda a finitude caiu por terra. No segundo seguinte eu tinha por perto borboletas imaginárias agressivas, que cansadas de sobrevoar o meu estômago, decidiram que era melhor dar socos nele. E o coração respondeu. Ele não foi forte o suficiente para resistir ao alinhamento da sua íris com a minha: deu duplos twist carpados com maestria de ginasta veterano. Tinha o nó na garganta também. Foram os cinco segundos mais longos da minha vida, com o rosto congelado para não transparecer a confusão de sensações que eu tinha por dentro. Uma enchente de agonia, com pitadas sutis de prazer. Como se eu nunca tivesse te esquecido. Como se uma mínima parte de mim estivesse feliz em te ver, depois de tanto tempo. E essa felicidade, tão ínfima, era suficiente pra fazer o resto de mim sofrer o dobro.
Foi aí que eu percebi que a grande questão não é que não tinha te esquecido. Eu esqueci e foi justamente por isso que me mantive sã por tanto tempo. A grande questão, no fim das contas, é que eu nunca deixei é de te amar. E é aí que a coisa pega. Talvez seja mais fácil não esquecer alguém. Pensar o tempo todo. Ficar na merda logo de uma vez. É perceptivelmente mais perigoso achar que não tem mais sentimento ali. Subir num salto alto de autoafirmação e pensar que tudo acabou bem, porque você se refez. E eu me refiz, enquanto me mantive longe. Eu procurei amar outras pessoas, coisas, situações e rotinas que não incluíssem a sua presença. E eu consegui. Eu te risquei do meu mapa. Eu te tirei do centro das minhas atenções. O que eu não sabia era que continuava te amando, em algum lugar escondido de mim, como que num fundo falso. E não era difícil manter a sanidade assim, me afastando de tudo que tinha você no meio, abrindo mão de ambientes que antes eu tanto prezava, em nome da minha saúde mental, emocional, cardiológica. Em nome do meu amor próprio.
Fiquei arrasada quando percebi que é muito fácil pra você acabar com todo o meu final feliz. Basta cruzar meu caminho. Dobrar a minha esquina. Olhar nos meus olhos, depois de anos a fio. Sem esforço nenhum, você pode acabar com toda felicidade que eu construí pra mim, minuciosamente. Porque eu sou vulnerável a você. Ainda sou. Não sei bem se um dia deixarei de ser. Que barra. Meus "pra sempres" nesse momento riem de mim sem nenhuma pena. A existência deles tem razão de ser, afinal.
Mas tudo vai ficar bem. O trem vai voltar aos trilhos outra vez. Eu vou reassumir o falso controle. A tampa do meu fundo falso quebrou agora, mas sempre dá pra fazer um remendo. Trocar de tampa, se for o caso. Usar madeira de lei, ferro, acrílico... Qualquer material mais forte. Vai. Ficar. Tudo. Bem. O mundo não parou. Não vai parar. E eu me recuso a parar também, ainda mais por causa de você.