Marcadores

domingo, 14 de julho de 2013

Siccità


Talvez aquele dia sob o chuveiro tenha sido o último. A última dança. O último beijo. A última escalada. O último compasso. A última oralidade de coisas que não devem ser ditas. A última gota. O último sonho.
Não sei se minhas unhas voltarão a desenhar nas tuas costas aqueles caminhos tortuosos, daquelas dez estradas paralelas que não sabiam pra onde iam. Só sabiam que eram. E eram por causa da explosão, da combustão. Eram por causa do você dentro de mim, que só existia quando eu fechava os olhos. 
O magnetismo perdeu um pouco da força desde que se viu sozinho: a razão deu um tapa na cara da ternura, enfim. Desiludida, a idealização do (im)provável romance curvou a cabeça e se foi. Sentido, cadê? Acho que foi, também. Me resta só esperar o retorno do oitavo, para observar se ainda serão acesas fogueiras às seis da tarde.
A chuva que eu dizia, duvidando, que ia passar, passou. Lá de volta, outra vez, à estiagem? Não cabe mais essa coisa latente no meu céu azul particular. As peças deixaram de se encaixar na minha realidade inventada. A atração ainda existe, mas sozinha. E então começo a pensar que ímãs também têm prazo de validade.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Paralelo

Às vezes a gente precisa inventar um fantasma novo para fugir dos velhos. Colocar máscaras no próprio rosto, antes de se olhar no espelho. Fantasiar, de alguma forma. Enlouquecer, para recobrar a sanidade. 
Aí de repente tudo parece bem. A euforia volta, mas sem a dor. Recostar a cabeça no travesseiro volta a ser doce, porque dormir volta a ser bálsamo, pois os sonhos bons voltam a nos encontrar em nossa cama, basta que as pálpebras vendem nossos olhos. E não se trata mais de fogo como há pouco, nem de lágrimas como há muito tempo. É só doçura gratuita. Casa de chocolate no bosque, sem ter bruxa dentro.
João e Maria que se apeguem às migalhas de pão para marcar o caminho percorrido. A minha ideia é esquecer os passos dados bem onde eles devem ficar: na estrada atrás de mim. E me perder nesse mundo que sequer me pertence e apesar de paralelo e afinado no meu tom, é distante. E seguir sorrindo bobo e cantando, mesmo que como uma segunda voz desmicrofonada. 
E tudo diminui de tamanho e fica pequenininho: meu passado triste que não foi além, meu presente inflamável que secou o botijão de gás antes de ser futuro, e até os problemas de verdade. Troco minhas improbabilidades possíveis por uma probabilidade impossível. Deixo a irrealidade brincar de real e, propositadamente, vez em quando esqueço que é brincadeira. Faço isso sem culpa, para poder, em alguns momentos, deixar de lembrar que o amor não existe... E fantasiar que ele existe, sim. E sorri. Sorri pra mim! Ao menos uma vez na vida. Ao menos de mentirinha.